O mercado imobiliário corporativo brasileiro entra em 2026 com uma dinâmica que poucos previram no auge da pandemia. A combinação de escritórios lotados, galpões logísticos em alta e uma terceira onda de retorno ao trabalho presencial está redesenhando o mapa das oportunidades para investidores de fundos imobiliários.
Quem acompanha FIIs de lajes corporativas e galpões logísticos precisa entender o que está acontecendo no chão de fábrica desses ativos. Os números mostram um mercado apertado, com vacância em queda, aluguéis em alta e uma escassez de novos projetos que deve se estender pelo próximo ano.
A terceira onda de volta aos escritórios
"Há uma terceira onda de volta aos escritórios", afirma Fábio Maceira, CEO da JLL no Brasil. Segundo o executivo, o movimento atual é diferente das fases anteriores.
A primeira onda veio ainda no finalzinho da pandemia, com retorno tímido e frequência muito menor que a capacidade dos espaços. A segunda trouxe mais confiança, com empresas estabelecendo regras de duas a três vezes por semana no escritório. Agora, a terceira consolida esse movimento, com algumas companhias sendo "bem vocais que o lugar de trabalho é no escritório".
Ainda que o fim da flexibilidade e o retorno ao deslocamento diário pesem na rotina do trabalhador, para o mercado imobiliário o impacto é o oposto, impulsionando os indicadores de ocupação e valorização. O Nubank é um exemplo citado de empresa que havia definido o home office como política e está revendo a estratégia. "Todas as empresas já estão assim? Não. Mas essas empresas grandes puxam tendências", observa Maceira.
São Paulo: vacância no menor nível em cinco anos
Os números da CBRE confirmam o aperto. A taxa de vacância em escritórios de alto padrão em São Paulo caiu para 16,8%, o menor patamar em cinco anos. Mais revelador ainda é o nível de pré-locação para 2026: cerca de 100 mil metros quadrados de um novo estoque previsto de 300 mil m² já estão comprometidos.
Esse volume de pré-locação é o maior já registrado em São Paulo entre um ano e outro. A média histórica entre 2010 e 2025 ficou em 38 mil m² anuais.
"Antes, várias empresas alugavam espaço em um prédio de 50 mil m². Agora, uma só pode pegar tudo. E os novos prédios estão chegando ao mercado com 10 mil m² a 15 mil m²", explica Felipe Giuliano, diretor de locação da CBRE no Brasil.
A insuficiência de novos projetos é um resquício direto da pandemia. Com juros altos, investidores preferiram apostar em galpões logísticos, impulsionados pelo e-commerce, em vez de escritórios que ainda se readaptavam ao retorno presencial.
Faria Lima esgotada empurra demanda para novas regiões
Com a Faria Lima praticamente sem espaço disponível, a demanda passou a aparecer com força em regiões como Rebouças e Pinheiros. "As regiões primárias já estão em valor de pico. Nas secundárias, eu vejo o aluguel subindo mais percentualmente que nas primárias, e a vacância diminuindo", diz Maceira.
O CEO da JLL cita o Parque da Cidade como exemplo de recuperação: começou a alugar por preço baixo e já conseguiu recuperar valor. Para 2026, sua previsão é que os aluguéis nas regiões secundárias subam percentualmente mais do que nas primárias.
Avenida Paulista: a volta por cima
Um dos movimentos mais interessantes está acontecendo na Avenida Paulista. Depois de perder protagonismo para Faria Lima e Itaim Bibi, o tradicional eixo corporativo volta a atrair empresas em busca de endereços centrais com aluguel mais acessível.
Os números falam por si: enquanto os valores médios na Paulista variam entre R$ 140 e R$ 170 por metro quadrado, locações na Faria Lima e no Itaim Bibi beiram R$ 260/m², podendo ultrapassar R$ 400/m² em trechos mais disputados.
A vacância na Paulista caiu de forma expressiva. No terceiro trimestre de 2025, apenas 3,6% dos escritórios de alto padrão estavam desocupados na região, a menor taxa da cidade, segundo a Newmark. O contraste com os 22,4% registrados em 2022 é gritante.
Desde 2021, cerca de 15 prédios das décadas de 1970 e 1980 foram modernizados na região, totalizando 185 mil m² de área locável. O retrofit se tornou essencial para manter a competitividade do endereço, já que há pouca área livre para novas construções.
Rio de Janeiro: Centro ganha força como alternativa
No Rio de Janeiro, a dinâmica é semelhante, mas com características próprias. A escassez de escritórios na Zona Sul, com vacância de apenas 7,5% em endereços como Flamengo, Botafogo e Glória, está empurrando empresas para o Centro.
A diferença de preço é brutal. "A locação de uma sala de 100m² no Leblon hoje está estimada em 30 mil reais por mês de aluguel. Em Botafogo, 18 mil reais em média. No Centro, 7 mil por mês bancam uma sala num prédio de ótimo nível e até vista", explica Lúcio Pinheiro, diretor de locações da Sérgio Castro Imóveis.
O Centro carioca ainda tem vacância elevada de 56% quando se considera o estoque total, incluindo imóveis mais antigos. Mas em prédios de alto padrão, a vacância média é de 20,5%. Proprietários tradicionais, incluindo irmandades e instituições religiosas, passaram a investir na requalificação de seus ativos para competir com os edifícios mais modernos.
Galpões logísticos: São Paulo se descola do Brasil
No mercado de galpões, São Paulo está se descola do restante do país. O preço dos aluguéis em galpões A+ na capital vai "muito em breve" ultrapassar a barreira dos R$ 50 por metro quadrado, prevê a CBRE, enquanto a maior parte das outras regiões opera numa faixa de R$ 28 a R$ 40.
"O mercado em São Paulo está muito dinâmico no raio 15 e no raio 30, e estamos começando a ver os primeiros projetos greenfield na cidade, cada um batendo recorde no valor da locação", diz Fernando Terra, vice-presidente da área logística e industrial da CBRE.
A oferta limitada em São Paulo, com poucas áreas disponíveis para desenvolver novos galpões e concorrência com o mercado residencial, é um dos fatores que impulsionam os preços. O eixo das marginais e o começo da Zona Leste, na região da Mooca, concentram a maioria dos projetos, com conversão de fábricas antigas.
A CBRE estima que o estado deve registrar 2,1 milhões de m² de novo estoque em 2026, um aumento de 50% em comparação ao que foi entregue em 2025. Desse total, 62% devem se concentrar em áreas do raio 30.
Apesar do aumento do estoque, não há risco de superoferta em 2026. A taxa de vacância deve seguir estável em torno de 8%, o menor patamar da história. "A escassez de terrenos, o alto custo de construção e o alto custo de capital vão continuar controlando a oferta", afirma Terra.
O setor encerrou 2025 com recorde de absorção bruta de 6,3 milhões de m², com o e-commerce atingindo 20% do total, a maior proporção para o segmento na história.
O que isso significa para investidores de FIIs
Para quem investe em fundos imobiliários, o cenário de 2026 apresenta algumas implicações práticas.
Nos FIIs de lajes corporativas, a combinação de vacância em queda e aluguéis em alta pode se traduzir em melhora dos rendimentos, especialmente em fundos com ativos em regiões secundárias que estão ganhando tração. A escassez de novos projetos limita a oferta e sustenta os preços.
Nos FIIs de galpões logísticos, o descolamento de São Paulo em relação ao resto do país favorece fundos com exposição à capital e ao raio 30. A demanda por entregas last mile segue como motor principal, e a pré-locação elevada indica que os ativos bem localizados devem manter ocupação alta.
O CEO da JLL faz uma observação relevante sobre o impacto dos juros: "Hoje, o investidor cotista do fundo imobiliário tem alternativas que pagam o CDB e ele não precisa entrar no mercado imobiliário. O CDB é um grande inimigo do segmento."
Se os juros caírem, os FIIs podem voltar a ficar mais atrativos, conseguir captar mais dinheiro e fazer mais aquisições. Mas o impacto direto nos escritórios, segundo Maceira, seria mais em transações e liquidez do que nos fundamentos do mercado.
O que está claro é que o mercado imobiliário corporativo brasileiro virou uma página. A dúvida sobre se escritórios seriam um bom mercado ou não ficou para trás. "Não há mais dúvida se escritórios são um bom mercado ou não, porque são", conclui o CEO da JLL.
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